amores expresos, blog do Joca

Tuesday, June 5, 2007

INTERLÚDIO: A ESFINGE

“Me conta uma história de amor, Esfinge?”
“Decifra-me ou te devoro.”
“Que é isso, o título da história?”
“Eu sou uma esfinge, cara. Eu proponho enigmas. Procure histórias de amor em outro departamento.”
“E o amor não é o mais indecifrável enigma jamais inventado, Esfinge?”
“Aí você me pegou.”
“Então. Conta uma história de amor aí, vai.”
“Hum... História de amor?”
“É. Bem bonita. Daquelas que fazem a gente chorar.”
“Mela-cueca?”
“É. Ando meio piegas. Deve ser a solidão do Cairo.”
“Solidão... Você não faz a menor idéia do que seja a solidão.”
“Que é isso, um enigma?”
“Decifra-me ou te devoro.”
“Pára com isso. Eu sei bem o que é a solidão. Não essa sua solidão cercada de areia e de vento, mas a solidão da metrópole. Sabia que a gente pode se sentir bastante sozinho no meio de 20 milhões de pessoas que não falam a nossa língua, Esfinge?”
“Agora você que me vem com enigmas.”
“O que aconteceu com seu nariz, Esfinge?”
“Ah, não, essa sim é que é uma história triste.”
“Ah, vai. Contaê.”
“Bem, como você deve saber, até o começo do século XIX o meu corpo estava inteiramente enterrado. Só aparecia a cabeça.”
“Não sabia, não.”
“Pois é. Foi só quando Napoleão invadiu o Egito, em 1798, que chegaram os especialistas que iniciaram os estudos sobre o Egito Antigo. Foram esses caras que me desencavaram.”
“Ah, tá. Então a história de amor que você vai me contar é a dos franceses pela Egiptologia.”
“Mais ou menos. Como você sabe, em história de amor sempre rola porrada.”
“E daí?”
“E daí que, além dos cientistas, Napoleão trouxe soldados, que gostavam de praticar tiro ao alvo aqui no meu nariz.”
“Tá brincando?”
“Por acaso eu estou sorrindo?”
“Não.”
“E a Mona Lisa, lá no Louvre, está sorrindo?”
“É outro enigma?”
“Decifra-me ou te devoro.”
“Deixa disso, Esfinge. Que mania.”
“Como você pode ver, meus dentes ainda não caíram.”
"E agora, você está sorrindo?"
"Claro que não. E isto também não é uma gargalhada."